IMD coordena estudo que investiga cérebro com ressonância funcional

Parceria internacional envolve UFRN, através do PPgBioinfo, Universidade de Coimbra e USP
23-10-2025 / ASCOM
Bioinformática BioME Pesquisa

O Instituto Metrópole Digital (IMD/UFRN) iniciou, neste mês, um estudo internacional voltado à área de Ressonância Magnética Funcional, em parceria com a Universidade de Coimbra e a Universidade de São Paulo (USP). A pesquisa busca aprofundar o conhecimento sobre o funcionamento cerebral humano, utilizando tecnologias de imagem de última geração.

Os experimentos do projeto serão realizados em uma máquina de ressonância magnética de ultra-alto campo de 7 Teslas — a mais potente da América Latina e da Península Ibérica —, instalada no Instituto de Radiologia (Inrad) do Hospital das Clínicas da USP. Com duração prevista de cinco anos, o trabalho é coordenado pelo professor André Peres, docente convidado do Programa de Pós-Graduação em Bioinformática (PPgBioinfo/IMD) e especialista na operação desse tipo de equipamento avançado.

A Ressonância Magnética Funcional — ou fMRI (do inglês Functional Magnetic Resonance Imaging) — é um exame de neuroimagem que mede e mapeia a atividade cerebral em tempo real. A tecnologia não capta diretamente os impulsos elétricos dos neurônios, mas sim as variações no fluxo sanguíneo no cérebro. Isso acontece porque quando uma região cerebral é ativada, consome mais oxigênio, de modo que o corpo aumenta o fluxo de sangue oxigenado para a área.

A ressonância, então, detecta essas mudanças por meio do chamado sinal BOLD (Blood Oxygen Level Dependent), que indica o nível de oxigênio no sangue. Com base nesse sinal, o exame cria mapas coloridos que mostram quais partes do cérebro estão mais ativas durante determinadas tarefas. Enquanto a ressonância magnética convencional mostra apenas a estrutura física do cérebro (ou de outros órgãos), a funcional mostra o funcionamento do cérebro em ação, isto é, como ele trabalha.

Objetivos

Um dos objetivos da pesquisa feita em parceria entre a UFRN, USP e Universidade de Coimbra é desenvolver, ao longo dos próximos anos, um “algoritmo de visão computacional bio-inspirado”, que se trata de um sistema computacional projetado para imitar o modo como os seres vivos – especialmente o cérebro humano – processa informações visuais.

O termo “visão computacional” faz referência ao ramo da Inteligência Artificial que busca fazer com que máquinas “vejam” e interpretem imagens e vídeos, reconhecendo padrões, objetos, movimentos, etc. A ideia do projeto é criar um algoritmos que seja capaz de realizar tarefas como essas e prever a ativação de certos campos cerebrais.

A relevância do projeto está também na utilização do equipamento de ressonância magnética empregado no estudo. Enquanto os aparelhos clínicos mais potentes operam com campos magnéticos de 3 teslas, o modelo utilizado pela equipe alcança 7 teslas — mais que o dobro da intensidade normalmente disponível, o que amplia significativamente a capacidade de observação.

De acordo com André Peres, essa potência permite “medir regiões muito específicas do cérebro. Isso é essencial se quisermos aferir estruturas muito pequenas no córtex e visualizar o processamento em uma escala mesoscópica – dimensão intermediária entre o nível celular e o de áreas inteiras do cérebro”.

Esse avanço, porém, vem acompanhado de desafios. A operação de um equipamento dessa complexidade é, por si só, uma conquista técnica importante para o projeto, exigindo conhecimento especializado e constante monitoramento. As imagens de ultra-alto campo são mais suscetíveis a ruídos e artefatos, exigindo que os pesquisadores programem a máquina manualmente e realizem testes constantes para acertar os parâmetros.

Repercussões

Ainda segundo o pesquisador, a criação do novo algoritmo de Visão Computacional prevê repercussões em diferentes campos. Além da pesquisa em Bioinformática, os resultados do estudo têm potencial para beneficiar tanto a Ciência como a Indústria.

Para a Bioinformática e Neurociências, por exemplo, o modelo permitirá entender melhor, e mais precisamente, como ocorre a ativação do córtex visual humano após o indivíduo ser apresentado a imagens e estímulos específicos. Isso também contribuirá para estudos em Fisiologia, com avanços na compreensão da atividade do Córtex Temporal Ventral (VTC).

Já no campo industrial, uma importante contribuição deve ser a utilização desse modelo na produção de equipamentos como câmeras com sistemas de reconhecimento automático de objetos.

Isso porque algoritmos bio-inspirados são menos afetados por fatores como ruído, imagens borradas ou oclusão (objeto parcialmente escondido). Essa robustez é essencial para sistemas como radares de velocidade, que precisam identificar placas de veículos mesmo sob baixa luminosidade ou com lentes embaçadas.

Além disso, embora o foco imediato do estudo não seja clínico, o modelo pode ter aplicação futura na Saúde e Neuropsicologia. O professor André Peres explica que pesquisadores poderão realizar "lesões virtuais" nos neurônios artificiais do algoritmo para simular síndromes neuropsicológicas conhecidas, como a dificuldade de pacientes em reconhecer materiais ou texturas (casos estudados atualmente em Coimbra).

Parceria internacional

Para a execução da pesquisa, a parceria internacional que foi firmada é fundamental, pois garante, dentre outras coisas, o aporte financeiro necessário e o acesso a equipamentos de última geração. Financiado com quase R$ 1,3 milhão do CNPq e avaliado com nota 9,6 (em uma escala de 10) pelo Conselho Nacional, o estudo também recebeu investimento de fundos europeus do ProAction Lab, de Portugal — coordenado pelo professor da Universidade de Coimbra Jorge Almeida —, que financia as horas de uso da máquina de ressonância magnética.

Na UFRN, a iniciativa é conduzida pelo professor André Peres, atualmente vinculado ao PPgBioinfo/IMD por meio do programa Conhecimento Brasil, do governo federal. O trabalho conta ainda com a participação dos professores Renan Moioli e César Rennó, ambos do Biome/IMD, e do docente Dráulio de Araújo, do Instituto do Cérebro (ICe/UFRN).

Máquina de ressonância magnética de 7 teslas, a mais potente da América Latina e da Península Ibérica

 

Os experimentos in vivo — que medem a atividade cerebral em voluntários humanos — estão sendo realizados em São Paulo, enquanto a etapa in silico, voltada ao processamento e à modelagem computacional dos dados, será desenvolvida no Biome/IMD, utilizando a infraestrutura do Núcleo de Processamento de Alto Desempenho (NPAD/UFRN).

Atualmente, os primeiros testes estão sendo executados em São Paulo, em colaboração com os professores Oswaldo Baffa, Maria Otaduy e Khallil Chaim, da USP, e a expectativa é que, após a conclusão dos ajustes técnicos, as coletas com os voluntários – que gerarão os primeiros resultados concretos do estudo – sejam realizadas no começo do próximo ano.

Texto: Felipe Araújo
Edição: Yuri Borges